Lei Geral em tramitação no Congresso traz normas de proteção comercial à Fifa e prevê até criação de três tipos penais
Brasília - É melhor deixar no armário aquela camisa do time do bairro com patrocínio de uma cervejaria artesanal que você e seus amigos planejavam usar juntos para assistir aos jogos da Copa de 2014. Há o risco de todos saírem do estádio para uma temporada de até um ano na prisão, sob a acusação de cometer o crime de “marketing de emboscada por intrusão”. O novo tipo penal não é ideia de deputados federais e senadores, mas apenas mais uma entre as exigências da Fifa para a realização do Mundial no Brasil.
Essa e outras demandas estão diluídas na proposta da Lei Geral da Copa, que deve ser votada na próxima terça-feira por uma comissão especial da Câmara dos Deputados. Será o primeiro passo para a aprovação da nova legislação, que tem sete do total de dez capítulos destinados à proteção comercial da Fifa. O pacote de medidas, muito pouco conhecido entre a população em geral, põe em xeque o conceito de soberania nacional.
Estudo da Paraná Pesquisas mostra que, praticamente, nove em cada dez curitibanos não sabem o que é a lei em discussão no Congresso (confira os dados completos do levantamento na página 3). A maioria da população ainda se revela contra a soberania da Fifa sobre o governo brasileiro.
“O potencial de essa lei gerar problemas é quase infinito”, opina Paulo Blair, doutor em Direito Constitucional e professor da Universidade de Brasília. Segundo ele, vários dispositivos solicitados pela Fifa terão a constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). “É uma questão de igualdade e limites: e se outros eventos privados reivindicarem os mesmos benefícios legais?”, questiona o especialista.
O eixo da proposta debatida pelos parlamentares nasceu de negociações diretas entre o governo e a Fifa. O texto original foi encaminhado pelo Poder Executivo à Câmara, em 2011, e transformado em um substitutivo, elaborado pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP). Apesar dos acordos, as principais polêmicas giram em torno de temas já regulados por leis vigentes – a venda de bebidas alcoólicas nos estádios, a responsabilização do Estado em caso de desastres naturais e a venda de meia-entrada para estudantes e idosos.
Para o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, as exigências não podem ser consideradas um atentado à soberania. “Existem os interesses comerciais, mas tudo é mediado pelas exigências que ela [Fifa] distribui. Quando o Brasil se candidatou, assumiu os compromissos que foram entregues. Nós aceitamos, assinamos isso”, disse ele durante passagem por Curitiba, no dia 13 de fevereiro.
O discurso não convence nem parte dos congressistas da base aliada. “Se isso que a Fifa quer não afeta a soberania, então não sei mais o que pode atingir”, contesta o deputado paranaense Dr. Rosinha (PT). Membro da comissão especial, o parlamentar promete brigar para que a direção do partido libere os petistas para votar como quiserem quando a matéria chegar ao plenário.
Uma das ponderações de Rebelo é que outros países que sediaram a Copa também se submeteram às ordens da Fifa. No Mundial de 2010, a propósito, 36 mulheres com microvestidos laranjas foram expulsas do estádio Soccer City, na África do Sul, durante um jogo entre Holanda e Dinamarca. Duas delas foram detidas e conseguiram ser liberadas apenas depois de pagarem uma fiança de 10 mil euros cada uma.
A acusação: a roupa continha uma pequena etiqueta de uma cervejaria que não era patrocinadora da Copa. O que só pôde ser entendido pelas autoridades sul-africanas como puro marketing de emboscada.
Proposta é discutida há cinco meses
O projeto da Lei Geral da Copa (2330/2011) foi enviado à Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo em 19 de setembro do ano passado, quase quatro anos após a Fifa ratificar o Brasil como sede do Mundial de 2014. O texto original passou por várias modificações desde a criação, em outubro, de uma comissão especial formada por 56 parlamentares para debatê-lo. Se aprovado na próxima terça-feira, dia previsto para a votação, segue para o plenário.
Depois disso, o próximo passo será a avaliação pelas comissões permanentes do Senado, até chegar ao plenário da outra casa do Congresso. Modificações promovidas pelos senadores podem forçar uma nova apreciação por parte da Câmara – como ocorre com o projeto de lei sobre o novo Código Florestal, por exemplo. Todas as aprovações dependem apenas de maioria simples, o que não garante uma trajetória fácil para a matéria.
Este possível “vaivém” da proposta entre Câmara e Senado não agrada nem um pouco à Fifa. Na visita que realizou ao Brasil em janeiro, o secretário geral da entidade, Jérôme Valcke, classificou a Lei Geral como a “base do sucesso na organização da Copa” e pressionou o governo para que a proposta seja sancionada até o fim de março, quando uma comitiva da Fifa, incluindo o presidente Joseph Blatter, deve voltar ao país.
A comissão especial dos deputados realizou até agora 18 reuniões, nas quais ficou claro que a questão não será resolvida apenas como um jogo entre governo e oposição. Deputados ligados ao esporte, como o ex-jogador Romário (PSB-RJ), têm feito duras críticas às negociações com a Fifa.
Na apresentação do primeiro substitutivo ao projeto feito pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP), em dezembro, o ex-atleta da seleção brasileira chegou a acusar – sem comprovar – que a federação internacional já tinha vendido todos os ingressos para a Copa: “80% foram comprados por um mexicano, 5% pelo sobrinho do Blatter, 5% por um japonês e 10% por uma empresa chamada Met”, declarou na época.
A última versão do substitutivo foi apresentada no último dia 15 por Cândido. Apesar de dispor de 23 artigos a mais que o projeto encaminhado pelo governo, o texto mantém a maioria das exigências da Fifa. Dentre os pontos polêmicos, permite a venda de bebidas alcoólicas nos estádios apenas durante a Copa e impede a venda de meia-entrada para estudantes, mesmo com a aprovação do Estatuto da Juventude.
“O potencial de essa lei gerar problemas é quase infinito”, opina Paulo Blair, doutor em Direito Constitucional e professor da Universidade de Brasília. Segundo ele, vários dispositivos solicitados pela Fifa terão a constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). “É uma questão de igualdade e limites: e se outros eventos privados reivindicarem os mesmos benefícios legais?”, questiona o especialista.
O eixo da proposta debatida pelos parlamentares nasceu de negociações diretas entre o governo e a Fifa. O texto original foi encaminhado pelo Poder Executivo à Câmara, em 2011, e transformado em um substitutivo, elaborado pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP). Apesar dos acordos, as principais polêmicas giram em torno de temas já regulados por leis vigentes – a venda de bebidas alcoólicas nos estádios, a responsabilização do Estado em caso de desastres naturais e a venda de meia-entrada para estudantes e idosos.
Para o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, as exigências não podem ser consideradas um atentado à soberania. “Existem os interesses comerciais, mas tudo é mediado pelas exigências que ela [Fifa] distribui. Quando o Brasil se candidatou, assumiu os compromissos que foram entregues. Nós aceitamos, assinamos isso”, disse ele durante passagem por Curitiba, no dia 13 de fevereiro.
O discurso não convence nem parte dos congressistas da base aliada. “Se isso que a Fifa quer não afeta a soberania, então não sei mais o que pode atingir”, contesta o deputado paranaense Dr. Rosinha (PT). Membro da comissão especial, o parlamentar promete brigar para que a direção do partido libere os petistas para votar como quiserem quando a matéria chegar ao plenário.
Uma das ponderações de Rebelo é que outros países que sediaram a Copa também se submeteram às ordens da Fifa. No Mundial de 2010, a propósito, 36 mulheres com microvestidos laranjas foram expulsas do estádio Soccer City, na África do Sul, durante um jogo entre Holanda e Dinamarca. Duas delas foram detidas e conseguiram ser liberadas apenas depois de pagarem uma fiança de 10 mil euros cada uma.
A acusação: a roupa continha uma pequena etiqueta de uma cervejaria que não era patrocinadora da Copa. O que só pôde ser entendido pelas autoridades sul-africanas como puro marketing de emboscada.
Proposta é discutida há cinco meses
O projeto da Lei Geral da Copa (2330/2011) foi enviado à Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo em 19 de setembro do ano passado, quase quatro anos após a Fifa ratificar o Brasil como sede do Mundial de 2014. O texto original passou por várias modificações desde a criação, em outubro, de uma comissão especial formada por 56 parlamentares para debatê-lo. Se aprovado na próxima terça-feira, dia previsto para a votação, segue para o plenário.
Depois disso, o próximo passo será a avaliação pelas comissões permanentes do Senado, até chegar ao plenário da outra casa do Congresso. Modificações promovidas pelos senadores podem forçar uma nova apreciação por parte da Câmara – como ocorre com o projeto de lei sobre o novo Código Florestal, por exemplo. Todas as aprovações dependem apenas de maioria simples, o que não garante uma trajetória fácil para a matéria.
Este possível “vaivém” da proposta entre Câmara e Senado não agrada nem um pouco à Fifa. Na visita que realizou ao Brasil em janeiro, o secretário geral da entidade, Jérôme Valcke, classificou a Lei Geral como a “base do sucesso na organização da Copa” e pressionou o governo para que a proposta seja sancionada até o fim de março, quando uma comitiva da Fifa, incluindo o presidente Joseph Blatter, deve voltar ao país.
A comissão especial dos deputados realizou até agora 18 reuniões, nas quais ficou claro que a questão não será resolvida apenas como um jogo entre governo e oposição. Deputados ligados ao esporte, como o ex-jogador Romário (PSB-RJ), têm feito duras críticas às negociações com a Fifa.
Na apresentação do primeiro substitutivo ao projeto feito pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP), em dezembro, o ex-atleta da seleção brasileira chegou a acusar – sem comprovar – que a federação internacional já tinha vendido todos os ingressos para a Copa: “80% foram comprados por um mexicano, 5% pelo sobrinho do Blatter, 5% por um japonês e 10% por uma empresa chamada Met”, declarou na época.
A última versão do substitutivo foi apresentada no último dia 15 por Cândido. Apesar de dispor de 23 artigos a mais que o projeto encaminhado pelo governo, o texto mantém a maioria das exigências da Fifa. Dentre os pontos polêmicos, permite a venda de bebidas alcoólicas nos estádios apenas durante a Copa e impede a venda de meia-entrada para estudantes, mesmo com a aprovação do Estatuto da Juventude.
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